CHEIROS E...CHEIROS
Hoje é domingo “pé de cachimbo” e um
lindo e alegre domingo ensolarado que risonhamente
A vida lá fora em festa! Aqui na
intimidade do meu lar, eu e minhas reminiscências...
Talvez o “cheiro” de vida trazido pela
voz de uma vizinha que, da rua chamava o filho caçula cobrando algum documento
do pai, tudo levando a crer que estavam de partida, muito provavelmente para a
praia e o lindo marzão que banha a nossa orla, tenha me reportado a outros
cheiros de momentos passados.
Desde que me lembro por gente, tenho um
famoso nariz de cheira-cheira.
Cheiros bons, apetitosos, gulosos,
cheiros sensuais despertando outros apetites, feromônios e também cheiros de perfumes
deliciosos, outros provocando náuseas e intolerâncias ao despertar lembranças
de episódios ou pessoas descartadas do convívio cotidiano.
Ai esse meu narizinho que já foi
arrebitado e atrevido, como me fez passear por mundos e cenas imaginárias e
como também me trouxe à realidade chã, crua e nua da vida!
Esse esmiuçador de cheiros e odores já
me colocou em frias e também me fez engordar quilos e quilos indesejáveis!
No tempo de normalista, vizinha ao
prédio da Escola, havia uma pensão que ascendia e fazia arfar minhas narinas e
despertando as papilas gustativas,
desviando a atenção das aulas quer de didática, psicologia ou pedagogia, para o
tempero do feijão, do arroz ou do bife que estavam sendo preparados e me faziam
salivar em hipnose quase total!
Esse
o meu nariz! E quantas peças me pregou!
Mas
a moral destas considerações é bem mais séria e impactante, desconcertante
mesmo!
Nem
só de memórias boas e agradáveis vive a memória de um nariz xereta de
cheira-cheira!
Confesso
algo constrangida que um dos cheiros de que sempre fugi foi o cheiro dos velhos
ou deveria dizer d@s velh@s?
Detalhes
das evoluções e modismos sócio políticas e linguísticas que não vem ao caso,
não dá ênfase a essa forma de dizer ou expressar, pois a meu ver e para o meu
emocional, muito mais sério é o cheiro mencionado pois ele me repugnava e
agredia e agredia muito mais a minha intolerância condenada pela censura
autoimposta e oriunda de princípios
religiosos e bases da educação familiar.
O
caso triste minha gente é que certa tarde de sábado, lá pelos idos dos fins do
ano de l988, chegando ao apartamento da minha mãe, como sempre fazia, para
jogarmos “Mexe-Mexe” um jogo de tabuleiro e pedras formando palavras cruzadas,
abraçando-a exclamei: - Mamãe, você sempre foi uma velhinha (69 anos) cheirosa
e hoje está cheirando a velha!”.
Não
vamos considerar a idade dela que, na ocasião era muito mais nova do que sou
hoje e muito menos a indelicadeza da minha observação, mesmo porque encontraríamos
algumas atenuantes possivelmente entendidas por uns e por outros não. O caso é
que o cheiro exalava e agredia minhas sensíveis narinas, mas foi deixado tudo para
lá em nome do amor e do jogo que tanto a deliciava!
Jogávamos
mesmo estando ela cega em razão de um A.V.C. que lhe atingira os nervos óticos,
mas não a memória e nem a lucidez, assim jogávamos com ela memorizando o tabuleiro e suas peças!
O
caso triste meus amigos, é que uns três dias depois desse nosso último jogo, ela veio a
falecer.
Com
o decorrer do tempo e remoendo minha indelicadeza, cheguei à conclusão de que o
cheiro que sentira em minha mãe, tinha sido o cheiro da morte! Minha
sensibilidade olfativa captara o processo de degeneração molecular, a morte dos
neurônios por certo.
Bem
mais tarde voltei a sentir esse mesmo cheiro e para pânico meu, o senti em mim
logo ao acordar, o que me manteve alerta e com todos os sentidos de sobreaviso
e bastante apreensiva, com medo mesmo e muito, melhor diria com uma danada “paura”!
Isso
aconteceu há quase cinco anos e foi dias antes que se manifestasse minha primeira e violenta
crise da artrite reumatoide que tanto tem limitado e judiado do meu viver!
Meu
narizinho fotogênico e atrevido hoje já não é mais elegantemente arrebitado
mas, continua sensível e cheirando os
ares de cá e quem sabe aos de lá?
Mariza C. de C.
Cezar