NUNCA RETORNOU!
A
harmonia do meu reino encantado se quebrou por uma história peculiar contada à
boca pequena pela vizinha da frente, em tarde domingueira.
Entre
um biscoito e outro e uma chávena de chá de jasmim, a vizinha do 1032 me contou
algo curioso, ocorrido com Marisol a
mulher do 1001.
Obesa
de dar pena, após longos, difíceis e infrutíferos tratamentos, foi encaminhada pelo
endócrino a psiquiatra, em busca de cura e esbeltez.
Sua
consulta foi um desastre!
Bem
a contragosto e pisando em ovos, munida dos documentos e exames de praxe,
contou-me a vizinha do 1032 que Marisol adentrou ao consultório de aparência
faraônica, imbuída de coragem e ressalvas. Sentou-se em local estratégico,
pronta para a fuga em qualquer eventualidade, mantendo-se com a bolsa sobre os
joelhos e estes juntos à beira da cadeira, como em posição de alerta.
Marisol
em tensão viu e ouviu muita coisa naquele consultório e, nada a tranquilizava!
Era um desfile contínuo e, “louquinhos da aldeia” que entravam e saiam todos
acompanhados e que, no caminho da entrada a seus assentos, bebiam de uma
garrafa de “torneiral”, todos babando e se servindo de um único copo de papel
ali disponível. Assustada e atemorizada assistia à prepotência incisiva e algo
abusiva da secretária que não repetia ordens sem intimidação. Entra um, sai
outro e Marisol em verdadeiro turbilhão e sempre atenta, até que chegou a sua
vez!
Com
amplo sorriso ultrapassa a porta. Para quebrar o gelo típico de tamanha
ansiedade foi logo dizendo:
-
Boa tarde doutor! E ao se sentar, prossegue: Tive um colega de turma com o seu
sobrenome Doutor.
E
o médico, levantando pela primeira vez os olhos da papelada que tinha à frente,
lhe pergunta:
-
De turma? Mas... o que a senhora fez?
-
Direito. Responde-lhe Marisol.
-
Aqui na Terra mesmo? E ante a aquiescência da paciente, retruca-lhe:
-
Não, não deve ser parente, pois minha família é do nordeste e eu nasci no
Espírito Santo e por mero acaso, pois os meus estavam em trânsito! E continuando,
diz-lhe o médico: Mas eu também tenho jurista na família, pois meu avô foi
Ministro do Judiciário e meu pai, era primo do General Casagrande do Amaral,
que foi Presidente do Brasil.
Presidente
ou ditador pensou Marisol? Mas, em voz alta, apenas lhe respondeu educadamente
e com medo da camisa de força, pois a secretária lhe dissera, ser o médico
diretor de hospício local: - Que beleza doutor! Meu pai não, mas meu avô também
era primo de dois dos nossos presidentes.
-
Não me diga! E quem foram eles? Pergunta-lhe o médico.
-
Campos Sales e Prudente de Morais, doutor. E este, com a ficha da paciente nas
mãos, indaga:
-
Mas, seu sobrenome não é Leme de Alcântara? Ao que Marisol lhe responde:
-
Sim Doutor, mas esse foi só um interventor no nosso Estado de São Paulo!
Ele
prescreveu-lhe remédio de tarja preta e marcou um retorno.
Mariza C.
de C. Cezar
Santos, 10/04/2014
2 comentários:
Adorei!!! Bem leve apesar do assunto ser denso, muito bom.
Retornar? Não mais! (rsrs)
Gosto das suas estórias e do seu jeito especial de contar!
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