Estava
uma noite, como habitualmente faço, a jantar eu e meus botões, em meu
restaurante preferido, na companhia agradável de um Tempranillo de boa cepa
espanhola, vermelho rubi com reflexos violáceos, sabendo ao nariz um complexo
buquê de amora e mirtilo, com notas de café e chocolate, encorpado, redondo e
de taninos macios, assim curtindo o bom vinho e o prazer de um bom prato.
Ali
em ambiente tranquilo, refinado, sem salamaleques, o que demonstra a qualidade
e bom tom que predominam no ambiente e serviço. A cozinha, delícia das delicias
que justifica a preferência e habituidade.
Num
instante, entre um gole e outro, enquanto esperava o prato principal, notei com
discrição a mesa ao lado, em que uma jovem confraternizava com agradável figura
de senhora às antigas, contida como mandavam os figurinos, entretanto
sorridente e de olhinhos vibrantes.
Percebi tratar-se de parentas e
pareceu-me que comemoravam alguma data, talvez o natalício da velha senhora e
me pus a calcular como que em jogo de adivinhação a idade da festejada.
Deveria
andar pela casa dos oitenta e decidi então que seria entre oitenta e três e
oitenta e seis no máximo!
Chegou
o meu pedido e me entretive logo com ele, entretanto a curiosidade é algo que
prende e com discrição passei a me ocupar da mesa ao lado e de suas comensais.
Um
ouvido aqui e outro ali e atento, quando percebi que a senhora abaixando a voz,
se tornara séria e reticente, quase que em tom confessionário, pediu à jovem,
de presente a satisfação de um desejo recalcado e escondido a vida inteira!
Discretamente
agucei os ouvidos curiosos, pois não
poderia perder o que estava a lhe exigir tanta comoção e esforço!
Não
é que a discreta senhora balbuciou o pedido, nada mais nada menos do que algo
que nunca ousara ao longo dos seus tantos anos e que não queria morrer sem
conhecer e curtir o efeito e o cheiro de um bom cigarro de maconha!
Não
sei lhes dizer detalhes, mas fiquei com a certeza de que a jovem deu à velha
senhora o presente de aniversário aguardado por longa vida, com medo e recato
exacerbados!
Mariza C.C.
Cezar
2 comentários:
Minha querida amiga: realmente esta sua pequena crônica (ou conto), consegue aguçar também a curiosidade do leitor - como foi o meu caso -, até o final inesperado. Sempre temos uma coisa na vida, muitas das vezes inconfessável, que gostaríamos de realizar. O desta senhora foi surpreendente. Parabéns.
Adorei Mariza, e me fez lembrar da minha mãe, que há 13 anos andou de asa delta. Eu e minha irmã ficamos em terra firme e minha mãe lá no alto!!
Desejo realizado!!
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