ERA
UMA VEZ..
No
tempo de capa e espada, em que príncipes e também aventureiros percorriam
estradas e densas florestas montados em seus corcéis, é que vamos encontrar o
garboso príncipe da nossa estória, montado em cavalo branco, saindo de densa mata,
para uma clareira.
Sedento
dirigiu-se para uma pequenina casa em que se via flores à janela e esvoaçante
cortina branca, enquanto da chaminé saia fumaça.
Chegando
mais perto deparou com lindo quadro emoldurado pelo batente da janela!
Nada
mais, nada menos do que a jovem mais bela que já vira, graciosa em alvas roupas
íntimas ou seja, uma blusa branca de alças com passa-fita, espartilho encimando
calças levemente bufantes, presa á altura da barriga da perna pela fita do
arremate que franzia gracioso babado.
Essa
linda donzela surpreendida assim, na intimidade do seu lar, tinha os cabelos
presos em longa trança ao lado dela, à
altura de sua orelha uma rosa vermelha.
Encantado
e sedento foi se aproximando e apeando, quando recebido por figura de velha
mulher que ao varal, vislumbrara a dependurar roupas.
Apresentando-se
disse da sede e convidado a entrar, encontrou a sonhadora e desenvolta donzela
que lhe prendera a atenção.
Foi
encanto e amor à primeira vista!
Matou
a sede e teve os desejos despertados e se quedou irremediavelmente apaixonado.
Arrebatado
de pronto, pediu à velha senhora a mão da moça a quem faria sua princesa.
A
velha senhora, avó da donzela a quem criara desde a mais tenra idade, vendo o
brilho em seus olhos e a postura e decisão do jovem príncipe, submissa,
aquiesceu ao pedido.
Quebrados
assim os protocolos pelo imperante desejo do príncipe, seguiu a jovem afoita,
em sua garupa.
Tão
deslumbrada estava com o conto de fadas que estava vivendo, que nem notou a
paisagem que percorriam até que chegaram a um castelo de pedras brutas em tons
de cinza.
No
interior do castelo, foi apresentada à Rainha-Mãe e à não tão jovem princesa,
irmã daquele que muito em breve viria a ser seu marido.
Logo
chamado o capelão e em tempo recorde, foi realizado com pompas,o casamento real com os protocolos
e aparatos da época.
Assim,
dentro das frias muralhas de pedra, passou a viver a agora jovem princesa.
Decorridos
poucos anos, distante da simplicidade e da bela e selvagem natureza que
circundara seu lar de menina sonhadora, a princesa começou a se sentir
desmotivada, cansada de viver praticamente trancada na alcova, em macio colchão
de plumas em que o príncipe a jogava, no ardor de sua insaciável paixão e
desejo.
Entre
quatro paredes, em colchão de plumas foram os dias decorrendo e essa era a sua
ocupação e prisão, da qual raramente saia e quando o fazia, era dentro do frio
castelo em que cruzava com as não menos frias, sogra e cunhada reais.
No
entanto um belo dia, passou pelo castelo uma caravana de saltimbancos que
recrearam a corte com seus números de malabarismo, cantos e danças, e a jovem
princesa que estava a perder o viço pela rotina, se encantou e o brilho voltou
a seus olhos, como o doce sorriso aos lábios, pois reencontrara a alegria e a
vida naquelas pessoas livres.
A
eles, decidida e sorrateira se juntou quando partiram. Fugida deixou a
Inglaterra com a caravana e com eles atravessou o mar onde é hoje o Canal da
Mancha e foram parar em Rouen, porto fluvial.
Aí
se deixou ficar. Vamos encontrar a nossa jovem com uma branca blusa franzida no
decote e ombros, rodada saia colorida com cintura alta apertando a já fina cintura e um engomado aventalzinho
branco, servindo em bandejas, rústicas canecas de cerveja em também rústica
taverna de beira de cais de eclética freguesia, pois ali bebiam trabalhadores
do porto, alguns burgueses e eventuais cavalheiros.
Rápida,
alegre, elegante, a formosa jovem atraia a freguesia e a todos atendia com
presteza e solicitude. Com seu jeito e charme despertava olhares, mas sua
postura afável mantinha os mais afoitos enquadrados e sem jeito.
Sério
e refinado fidalgo se enamorou e passou a ser assíduo à taverna até que a
conquistou e pedindo as contas, com ele partiu deixando na taverna corações
também partidos.
Vamos
encontrá-la em casa grande e assobradada em esquina de praça, calçada com
pedras também brutas. Agradável residência circundada por gracioso jardim,
grades e portão de ferro fundido como a balaustrada da sacada do quarto e que
era arrematada por jardineira de preciosos cravos.
Assim
passou a viver a agora jovem senhora, e viveu seu conto de amor e encanto de
amar, por algum tempo, descobrindo que o seu cavalheiro não era muito diferente
do príncipe, pois era ciumento e também a prendia em casa, se bem que
agradável, arejada, colorida pelas flores que atraiam pássaros canoros. Com o
passar dos dias também lhe pareceu uma prisão.
Nossa
heroína amava a liberdade e não era arruaça que procurava, apenas alegria e
liberdade de ser e viver.
Fugiu
novamente! Vamos reencontrá-la servindo na mesma taverna!
Um
dia reapareceu o fidalgo e veio decidido a arrancá-la dali e, quando percebeu
serem vãs suas palavras e argumentos, tresloucado e desvairado, desembainhou a
espada e incontinente a nossa jovem foi ao chão! Da sua blusa branca,
sobressaia uma mancha vermelha de sangue que crescia em formato de coração!
Seu
último olhar foi da espada à mão que a empunhava e ela levou nos olhos, a
figura do seu agressor!
Mariza
C.C. Cezar